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Análise | Frostpunk e seu mundo de gelo, decisões difíceis e pressão constante

Por| 30 de Abril de 2018 às 10h28

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Análise | Frostpunk e seu mundo de gelo, decisões difíceis e pressão constante
Análise | Frostpunk e seu mundo de gelo, decisões difíceis e pressão constante

O que você faria se tivesse que abandonar sua casa neste momento? Imagina sua vida se, de repente, o sol de fim de tarde que bate em sua janela fosse substituído por uma intensa nevasca que acabasse com todas as coisas que conhece? Como agiria se tivesse que largar o emprego atual para trabalhar na coleta de carvão para garantir a própria sobrevivência e a dos outros cidadãos?

E se você fosse o líder e tivesse a responsabilidade de cuidar de todos? É assim que, em Frostpunk, a 11 bit Studios apresenta uma série de novidades ao criar um RTS de sobrevivência. Aqui, não estamos lidando com uma sociedade em expansão ou uma nação em pé de guerra, mas sim com um povo devastado e sem esperanças, cujas últimas forças estão diretamente relacionadas ao grande gerador de energia que fica no centro dela.

É ele o centro de sua cidadela gelada e, também, o coração de toda aquela sociedade construída às pressas. A grande máquina é a responsável por gerar energia e garantir que todos os cidadãos permaneçam aquecidos, evitando um doloroso congelamento. Se ele for desligado, tudo para e a população vai morrer, sendo você, como líder, um dos primeiros da lista.

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Mas não é apenas isso. Ao longo de sua jornada, o jogador também deve atender a anseios que vão além de apenas aquecimento, comida e cuidados básicos. Novamente, estamos falando de gente que perdeu tudo, inclusive suas famílias. Esperança, mais do que carvão, alimentos, madeira ou ferro, é uma moeda escassa por aqui.

Sobrevivendo no inferno

O gerenciamento de Frostpunk acontece em diversas frentes. Primeiro, e de forma imediata logo após a cutscene inicial, o jogador precisa começar a construir sua cidade. É hora de começar a coletar os recursos que estão espalhados pelo mapa e construir abrigos, enfermarias e cabanas para caçadores. Mas esse, entretanto, é só o primeiro passo.

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Ao longo dos dias, é possível desenvolver novas estruturas que aumentem a obtenção de recursos e facilitem o trabalho, liberando mãos para outras tarefas. O tempo e os recursos são os principais elementos aqui, com o jogador tendo de saber trabalhar com pouca gente e muita pressão para otimizar as coisas e garantir que o crescimento da cidade seja sustentável.

Nesse aspecto, entretanto, é possível perceber falhas de usabilidade. Em um aspecto positivo, Frostpunk não leva o jogador pela mão, permitindo que ele escolha seu próprio caminho e consulte o tutorial interativo somente se necessário. Entretanto, as descrições de unidades nem sempre são claras o suficiente, o que pode levar a decisões erradas motivadas por esse desconhecimento.

O sistema de ruas que conecta o grid circular ao gerador central, por exemplo, nem sempre funciona direito. Além disso, usinas e minas podem parar de funcionar inesperadamente, indicando que seus estoques estão cheios, sem que o jogador saiba exatamente o que fazer para resolver isso, enquanto o posicionamento de estruturas em determinados locais é impossibilitado por elementos que o jogador nem sempre sabe exatamente quais são.

Os indicadores no topo da tela, que mostram as reservas de recursos, são quase tão importantes quanto os que aparecem na parte inferior, mostrando o sentimento de insatisfação da população e também sua esperança em dias melhores. De nada adianta ter uma sociedade funcional se ela não for sadia, com pessoas que acreditam no que estão fazendo.

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Frostpunk permite dar propósito a elas de diferentes maneiras, todas interligadas entre si em maior ou menor grau. Além da óbvia necessidade de manter todos abrigados, alimentados e quentinhos, é possível passar leis que adicionam novas possibilidades de gerenciamento ou atendem aos anseios da população.

De início, são poucas mãos para fazer muita coisa e uma das primeiras opções é passar uma lei que permite o trabalho infantil. Isso gera descontentamento, não tanto quanto outra norma, que garante turnos de trabalho emergencial ou extensões na jornada diária. Porém, tais escolhas também têm consequências, como mortes por exaustão e mais acidentes, gerando uma necessidade maior por leitos médicos.

Tomou uma decisão impopular? É possível revertê-la adotando a boa e velha política do pão e do vinho, afinal nenhuma população insatisfeita resiste a uma boa arena de duelos ou à abertura de um bar local. É nesse ensejo, também, que está entranhada outra forte característica dos jogos do 11 bit Studios: o foco nas decisões morais.

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A empresa chamou a atenção com seu título anterior, This War of Mine, no qual o jogador controlava remanescentes de uma guerra em busca de recursos. Isso, porém, acontecia de maneira menor, com o roubo de uma fonte de alimentação, por exemplo, garantindo a própria sobrevivência em detrimento da de outros. Agora, porém, os questionamentos ganham novos ares de importância quando todo o destino de uma sociedade está nas mãos do usuário.

Jogar Frostpunk é tanto um jogo digital quanto mental. Ao mesmo tempo em que a necessidade de decisões difíceis bate forte, ao tomá-las, o jogador pode perceber que as consequências não são tão graves assim e, principalmente, podem ser revertidas por meio da passagem de outras leis. E assim, nesse jogo de morde e assopra, seguimos na direção de algum tipo de redenção que não sabemos se existe de verdade.

Da mesma maneira, é muito fácil ver uma sociedade aparentemente saudável se transformar em uma ditadura meio que sem querer. Nenhuma população é completamente feliz e plena e, eventualmente, revoltosos podem começar a ganhar força, alterando o balanceamento social. Medidas usadas apenas para punição de criminosos, entretanto, podem ser aplicadas como uma forma de manter a ordem, mas a que preço?

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Toda a experiência de Frostpunk segue nesse jogo de dicotomias, de forma a garantir que o jogador jamais esteja confortável. O game faz questão de lembrar, o tempo todo, que todo o ambiente é incrivelmente instável, desde as ruas de uma cidade apinhada de gente até o exterior gelado e sujeito a quedas bruscas de temperatura com a passagem dos dias.

Mesmo reservas de recursos que pareciam confortáveis podem se transformar perigosamente curtas quando uma grande nevasca atinge a cidade, reduzindo a temperatura já baixa em mais algumas dezenas de graus. O desenvolvimento é necessário para garantir sustentabilidade, já que os elementos disponíveis no mapa não durarão para sempre. E, acima de tudo, um ambiente pacífico pode se transformar rapidamente em um caldeirão caso você tome as decisões erradas.

As consequências das escolhas feitas em Frostpunk acontecem no longo prazo. Ao escolher leis que garantam a estabilidade da população, o jogador também poderá estar acendendo a fagulha que, mais tarde, dará origem a uma rebelião. Como na vida real, nem sempre é possível saber exatamente o que vai acontecer no futuro e o usuário deve contar com o bom senso e a sorte para seguir adiante.

Explorando o lado de fora

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Com tudo isso, Frostpunk ainda encontra espaço para contar uma história. Além de olhar para o ambiente interno, o líder também precisa observar o que está do lado de fora das próprias fronteiras. Logo de início, o pedido de um popular é emblemático, indicando que há algo, lá fora, que precisa ser buscado.

Por mais que estejamos em um ensejo dos piores, não sabemos exatamente o que aconteceu. O game apresenta uma história passada no final do século XIX, no auge das máquinas a vapor, quando o desenvolvimento acelerado da humanidade é interrompido por uma tremenda nevasca. E é basicamente isso.

A população é formada de gente que perdeu tudo, incluindo parentes que estavam em cidades distantes a Londres, origem de nossa sociedade, e amigos que ficaram pelo caminho durante a migração para a cratera onde tudo começou de novo. Elas querem saber o destino de seus entes queridos e, mais uma vez, é responsabilidade do líder fazer isso.

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Juntamente com habitação, unidades médicas e coleta de recursos, o jogador também pode ordenar que expedições busquem as cidades próximas em busca de sobreviventes, algo que aumenta a esperança e também garante mais mão-de-obra, mas também bocas adicionais para alimentar. Nessas viagens, recursos em grande quantidade também podem ser obtidos, bem como itens que não são encontrados de outra maneira e serão extremamente importantes na evolução desta nova sociedade.

É desse jeito, e com direito a participações especiais de figuras históricas como Nikola Tesla, por exemplo, que Frostpunk vai revelando, pouco a pouco, o que aconteceu. A impressão é de que todo o planeta foi devastado pela nevasca e cada novo local encontrado abre novas informações, em meio a cadáveres dos mortos de uma sociedade como a sua, mas que sucumbiu à barbárie, ou pelo relato de sobreviventes salvos que, de outra maneira, morreriam sob os dentes de animais selvagens.

Da mesma maneira que as leis internas, tais elementos também contribuem para a esperança ou o descontentamento. Encontrar gente viva também significa levar, de volta para a cidade, familiares e gente querida de quem já está por lá. Entretanto, chegar a um local e enxergar nada mais do que cadáveres onde deveria estar uma grande cidade gera desespero e a noção de que toda aquela luta pode não valer de nada.

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E é assim, nesse vai e volta, que Frostpunk surge como um dos grandes expoentes dos games de estratégia, um estilo que não recebe tantos lançamentos grandes quanto merecia. Este é um que pode ser jogado tanto por quem manja do gênero quanto por aqueles sem experiência em jogos desse tipo. É claro, a experiência vai contar bastante, mas não é mais importante do que o bom senso e o estômago para tomar decisões moralmente complicadas.

A obra da 11 bit Studios mostra, ainda, que a empresa evoluiu em relação a seu último grande trabalho, This War of Mine, e, com o perdão do trocadilho, ainda tem muita lenha para queimar. Sobreviva, se conseguir, e torça para chegar ao final desta jornada com a cabeça ainda colada ao pescoço.

*Frostpunk foi analisado no PC em cópia digital gentilmente cedida ao Canaltech pela 11 bit Studios.